segunda-feira, 4 de novembro de 2013

Apanha da Castanha - Um Ritual de Outono

O facto de não ter comigo a câmara fotográfica não podia ser impeditivo de aproveitar a minha viagem à capital da castanha para registar alguns aspectos da apanha deste fruto milenar. Smartphone em punho e seja o que for. Em Quintãs, Sernancelhe, os soutos dominam a paisagem. Há por esta altura um movimento desabitual pelas ruas da aldeia que dão acesso às serras onde o castanheiro ainda é rei e senhor. Depois do caminho calcetado serpenteando velhas e abandonadas casas de pedra, passa-se a ribeira para a outra margem e deixa-se o caminho de terra guiar-nos até ao souto. A Dona Ester há mais de 50 anos que está habituada a esta rotina. Com vários soutos espalhados pela povoação, entretanto já repartidos pelos filhos, esta simpática e acolhedora senhora percorre-os diariamente para apanhar as castanhas que vão caindo. Com a maior parte dos filhos no estrangeiro e outros fora da terra, a Dona Ester sai de casa com o balde, martelo de madeira e luvas. À chegada ao souto sou brindado com uma breve explicação sobre soutos, castanheiros e castanhas. Já pisávamos o abundante tapete de ouriços com as cores do Outono quando me foi explicado que muitos daqueles castanheiros já existiam quando nasceu e outros já foram postos pelo seu marido de quem é viúva há alguns anos. Numa primeira fase é necessário passar com um martelo de madeira próprio para o efeito para abrir os ouriços mais teimosos que ainda guarda o fruto dentro de si. Com as castanhas à vista é então altura para calçar as luvas e apanha-las. O contacto com os ouriços é frequente e as luvas são essenciais para evitas as picadelas (por isso mesmo rapidamente me rendi também às luvas). Aos poucos o balde vai enchendo e verte-se para uma saca que fica no terreno até ficar cheia, pronta a ser transportada no carrinho de mão. Algumas castanhas terão inevitavelmente como destino o estrangeiro onde filhos, netos e bisnetos as esperam para a cada dentada regada com jeropiga recordarem esta tão bela e tradicional povoação de Quintãs, no coração deste seu Portugal. Outras terão como destino a venda, que é uma boa ajuda para juntar à pequena reforma.
Em muitos locais de castanheiros, mas neste em especial, esta árvore assume um papel primordial na cultura e economia da população. Daqui saem milhares de quilos de castanha para esse Portugal a fora. Desde o berço que a estes habitantes lhes foi incutido o valor e a importância desta actividade. Aqui como em nenhum outro lado, os soutos, os castanheiros e as castanhas não só se cruzam como se fundem com a vida das pessoas, acompanhando-as toda uma vida.










    Dedicado à minha querida avó Ester e ao meu avô João que esteja onde estiver certamente está a olhar por nós...


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