Uma correria
desenfreada, uma azáfama infernal. Ao aproximar-me do foco de incêndio começava
já a sentir o urro monstruoso e o crepitar do consumo vegetal. O fumo
acentuava-se e dificultava a marcha apressada mas não a vontade de enfrentar o
inferno que insistia em levar os pertences aos pobres inocentes que lutavam
desesperadamente. Os gritos de aflição rompiam-me pelos ouvidos a dentro, as
lágrimas gemidas de quem perde parte da sua vida faziam com que a revolta
dentro de mim pisasse qualquer sentimento de tristeza.
Ao
ver-me frente-a-frente com a poderosa parede de chamas que arrasava o pinhal
com total indiferença por quem o contrariava, juntei-me aos guerreiros
incansáveis na sua luta. O som das labaredas gigantes arrepiava à queima da
rama verde. O espectáculo visual consumia a alma, chamas com muitos metros de
altura avançavam furiosamente rápido. O calor acutilante atirava-se à pele como
lâminas sem piedade. O fumo envolvia-nos num abafo intoxicante que cegava os
olhos que se defendiam com lágrimas forçadas e turvava a visão. A respiração
era deficiente ou praticamente nula. A cada oportunidade, uma investida contra
o "Adamastor" de chamas demonstrava que o trabalho de equipa dos
bravos lutadores haveria de ser recompensado. Mas o vento, esse era de quem nós
dependíamos. As suas constantes mudanças brincavam connosco ora ateando outros
focos, ora lavrando mais rápido, ora intoxicando-nos com o fumo. A boca seca
denunciava a desidratação que rapidamente se instalara e a sede prendia a
garganta causando desconforto. Pás em punho atiravam terra para onde houvesse
chamas, ramos verdes tentavam abafar a sua ira. Aos poucos íamos vencendo.
Tentar tirar partido de quando o vento nos era favorável era fundamental.
Depois de muita luta, cansaço e suor conseguimos reduzir as chamas. Passado
algum tempo apenas restava fumo, a cinza, o negro, o cheiro forte do queimado.
Mas isso só naquele local porque logo ali perto uma coluna de fumo negro que já
cobria o céu anunciava que o inferno não dava descanso. Só tínhamos uma coisa a
fazer e foi o que fizemos: ir na sua direcção para combate-lo.
Notas:
Não encontrará nesta reportagem as típicas fotografias de jornalismo na frente de fogo uma vez que eu como "não jornalista" tinha como missão auxiliar a população e bombeiros no combate aos incêndios e não fotografa-los, tendo apenas feito (na frente de fogo) alguns registos com o telemóvel
Os relatos aqui feitos foram sentidos e vividos na primeira pessoa. Quando as frentes de fogo são muitas é praticamente impossível aos bombeiros conseguirem estar em todos os locais, assim, os populares desempenham um papel fundamental no combate aos incêndios, estando até muitas vezes sozinhos (como no caso do meu grupo). Além das muitas pessoas que defendem os seus terrenos, as suas colheitas e os seus animais, muitas outras actuam no combate ao fogo não pela perda de bens materiais mas pela solidariedade com as pessoas e com a natureza (como no meu caso).
Devido à sua importância extrema, dedico esta reportagem em geral a todos os populares que ajudam a combater os incêndios e em específico a todos aqueles com quem estive a combater nestes dias de Agosto de 2013 os incêndios que devoraram a maior parte da floresta beirã.
Um belo blog, com fotos impressionantes, parabéns amigo, desejo-lhes boa sorte.
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